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quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Vamos à história dos subúrbios


Por Ellen Reis

Considerado como o maior nome da literatura nacional Machado de Assis, como poucos, conseguiu perpetuar sua obra. E mais: conseguiu permanecer um mistério. Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Para tentar desvendar, ou pelo menos entender esse enigma, o organizador do livro “Quem é Capitu?”, Alberto Schprejer, tenta reunir nessa obra os contos, as crônicas e os ensaios sobre a personagem mais enigmática da literatura brasileira. Personalidades como Luis Fernando Verissimo, Lya Luft, Millôr Fernandes, Luis Fernando Carvalho, Lygia Fagundes Telles, Mary Del Priore, Fernanda Montenegro, Silviano Santiago, John Gledson, Roberto DaMatta, Gustavo Bernardo, Luiz Alberto P. de Freitas, Daniel Piza, Otto Lara Resende e Carla Rodrigues ousam desvendar o mistério que está acima de qualquer outro: Quem é Capitu?

Em Dom Casmurro, Machado de Assis tenta e consegue, com tamanha maestria e fina ironia, colocar uma ‘pulguinha’ atrás da orelha do leitor com o maior enigma da literatura brasileira. Passado mais de um século da sua criação, a Capitu de Machado é muito mais do que uma mulher forte e dona do seu destino, como diz a atriz Fernanda Montenegro, “os olhos de ressaca, de cigana oblíqua e dissimulada da personagem de Machado de Assis são o patrimônio feminino brasileiro”. Para a atriz, o Brasil, embora seja nome masculino, é no fundo uma Nação Capitu. Como mulher dos palcos, Fernanda analisa Capitolina com o olhar de uma atriz: é destrinchando um tema, discutindo o texto, perpassando cada parte que se chega à clara conclusão de que Capitu é inconfundivelmente a cara da brasilidade.

Com o texto intitulado “Não traiam o Machado” Otto Lara Resende coloca em dúvida a própria dúvida do adultério. “Dom Casmurro” saiu em 1900 e Machado morreu em 1908, nenhum crítico jamais ousou negar o adultério de Capitu. Esse questionamento é obra de professores que tentam confundir a cabeça dos alunos. Machado jamais explicitaria um adultério “com uma grosseira cena como um flagrante policial”. Mas, com fragmentos como “O filho é a cara do pai” (só quem leu o livro vai poder identificar em que contexto a frase é dita) prenuncia uma das provas incontestáveis de que não há enigma. Capitu é culpada! E nem tente “virar o romance pelo avesso. Machado merece respeito”. E para os professores: “ensinar errado é pecado capital”.

Escobar e Bentinho minissérie Capitu (Rede Globo)
O gênio Millôr Fernandes, como sempre, é a maior surpresa do livro. Enquanto que os outros 14 discutem a personalidade e características de Capitu, Millôr analisa “O outro lado de Dom Casmurro”. O lado que ninguém percebe é o que Millôr aprecia: a relação de Bentinho e Escobar. Tá, tá, ok, todos já sabem do papel de corno de Bentinho, mas ninguém se questionou sobre o status de corna de Capitu? Ninguém percebeu a intimidade dos dois amigos? Millô não faz interpretações, mas retira frases do próprio texto para comprovar - ou pelo menos fazer a ‘pulguinha’ atrás da orelha crescer – o relacionamento amoroso entre Bentinho e Escobar. “Escobar, você é meu amigo, eu sou seu amigo também; aqui no seminário você é a pessoa que mais me tem entrado no coração”. “Escobar apertou-me a mão ás escondidas, com tamanha força que ainda me doeu os dedos”.

Maria Fernanda Cândido na minissérie Capitu (Rede Globo)

“Por mais definições que se possa fazer sobre Capitu a sua aparência “verdadeira” fica apenas no terreno das possibilidades, deixando cada leitor a tarefa de sonhar sua personagem. ”(Alberto Schprejer).

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